sábado, 24 de novembro de 2012



Ouço o comboio ao longe, pego na minha velha e reduzida mala de viagem e aguardo impacientemente pelo transporte que me levará à minha nova vida, aquela que ainda não programei.
Não sei do que fujo. Não sei se fujo de ti, ou do desejo incontrolável de te ter. Não sei se fujo dos teus olhos cor de mar, ou da vontade de mergulhar neles. Não sei se fujo, ou se simplesmente me afasto. Não sei se o faço por um motivo egoísta, ou se para te libertar de insanidade e turbulência que me constitui e forma.
Não quero prender-me, mas, acima de tudo, não quero prender-te. Seria cruel deixar que permanecesses aqui, não podendo dar-te qualquer certeza de que amanhã o rumo seria o mesmo. Também estaria a enganar-me a mim mesma, se te garantisse de que podes controlar a minha alma livre. Mas a verdade é que, por mais que me tente iludir e convencer do contrário, também não quero libertar-te. Não quero que vás embora, não quero que te esqueças de mim. Preciso de ti. Preciso do teu toque de uma forma insaciável, preciso da tua presença de um jeito que me consome. Dependo de ti, vivo para ti. O teu rosto apoderou-se do meu âmago, e a noção de que poderei ficar enjaulada no teu coração, aterroriza-me. A noção de que poderei, inconscientemente, acorrentar-me ao teu jeito, pondo em risco o meu contrato de não deixar que me cortem as asas, atormenta-me. Com a consciente noção de que, abrindo o meu coração, talvez este seja arrancado, espezinhado, quebrado mais uma vez. Talvez tudo isto não passe de uma obra pintada por uma mente sonhadora, esperançada, traiçoeira. Uma mente que pintou um mundo perfeito para alguém tão imperfeito. A minha mente. A minha triste mente.
Entro no comboio que chega mesmo a tempo de me varrer os pensamentos. Não hesito. Não fracasso. Sento-me do lado da janela, despedindo-me do lugar que mudara a minha vida.
Fecho os olhos, respiro fundo, arranjo coragem para permanecer sentada, enquanto o sangue me fervilha nas veias, exigindo retorno.
Porém, por detrás daquelas velhas e poeirentas cortinas verdes que cobrem a janela, vislumbro um rosto familiar. Peculiar. Único. Marcante. Tão meu conhecido. Vejo uma súplica no silêncio dos seus traços. Uma última e fugaz esperança.
Corro para a porta de saída do comboio na ânsia desvairada de saber se é real, e alcançando-te, abraço todo o meu mundo. Beijo-te com todo o meu coração.
Talvez sejas tu a estabilidade de que tanto preciso, talvez não. Mas, pela primeira vez, estou disposta a correr o risco. Sem medo. Sem hesitação. Contigo. Só contigo.

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